Em Brasília, povos participam da I Conferência Nacional de Política Indigenista

Ao som do maracá e com um ritual sagrado feito por todos os povos indígenas do Brasil, lembrando a luta dos antepassados que derramaram seu sangue lutando pelas conquistas dos direitos indígenas, iniciou-se nesta segunda-feira (14) a I Conferência Nacional de Política Indigenista (CNPI), no Centro Internacional de Convenções do Brasil (CICB), em Brasília. Até o dia 17 de dezembro, cerca de 2,2 mil pessoas, distribuídas entre representantes indígenas, organizações não-governamentais, órgãos de governos e interessados no assunto, debaterão os rumos e o futuro da política indigenista brasileira.

Estiveram na mesa de abertura o ministro da Justiça, José Eduardo Cardoso; o presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), João Pedro; o secretário de Saúde Indígena do Ministério da Saúde, Antônio Alves; o representante do ministro da Cultura, TT Catalão; o secretário executivo do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Cleber Buzatto; os indígenas Sônia Guajajara, Paulo Tupiniquim, Marcos Tupã, Megaron e Serewê Xerente.

O ministro da Justiça José Eduardo Cardozo ressaltou que a Conferência é um momento histórico para o Brasil, pois pela primeira vez povos indígenas e governo sentam para discutir com franqueza, com sinceridade, o futuro da política indigenista do país. O ministro foi enfático ao dizer que é preciso afirmar os direitos constitucionais dos povos indígenas e que é contra a PEC 215.

Sônia Guajajara, uma das representantes indígenas na mesa, deixou claro que “ Nós não somos favoráveis ao golpe de estado, porque os mesmo que propõe golpe são os mesmo que estão propondo a PEC 215; o projeto de lei da mineração. Nós queremos sim viver, sentir o aprimoramento de uma verdadeira democracia que hoje nós não temos, não vivemos. Nós queremos estar juntos nesse aprimoramento da democracia, exigindo o cumprimento dos direitos adquiridos. Precisamos de atitudes e não somente de discurso”, afirmou Sônia. Diferentes povos, de todas as regiões do país, acreditam na mudança de uma nova política indigenista, e assim como Sonia Guajajara, querem que o discurso seja colocado em pratica.

O presidente da Funai, João Pedro Gonçalves da Costa, falou que esse momento é de grande luta e conquista para os povos indígenas, que são o futuro desse país, e espera que essa Conferência represente uma grande mudança na política indigenista do Brasil e que a Funai saia diferente para atender as exigências dos povos indígenas e preparada para enfrentar os grandes debates. “Nós vivemos em uma sociedade que tem muita força, que tenta passar por cima dos direitos originários de quem fez essa grande nação, afirmo a todos que a Funai é contra a PEC 215, e digo que estaremos juntos na luta, na rua, e contra qualquer ataque que atinja  os povos indígena desse pais”, finalizou João Pedro Gonçalves.

 

 

Por: Erisvan Bone

Conferência Indigenista aprofunda discussão dos eixos temáticos

No segundo dia (15/12) da Etapa Nacional da 1ª Conferência Nacional de Política Indigenista (CNPI) os participantes foram divididos em seis grupos de trabalhos, tendo como base os seis eixos temáticos: 1 – Territorialidade e o direito territorial indígena; 2 – Autodeterminação, participação social e direito à consulta; 3 – Desenvolvimento sustentável de terras e povos indígenas; 4 – Direitos individuais e coletivos dos povos indígenas; Diversidade cultural e pluralidade étnica no Brasil e 6 – Direito à memória e à verdade. A ideia foi aprofundar nestes espaços de debates propostas para a elaboração de uma política indigenista.

No primeiro grupo, o tema foi “Territorialidade e o direito territorial dos povos indígenas”, com a participação de um representante da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib); Walter Alves Coutinho Junior, da Diretoria de Proteção Territorial da Fundação Nacional do Índio (Funai); João Pacheco de Oliveira, do Museu Nacional. Nesse grupo os delegados indígenas enfatizaram a criação do Conselho Indígena para que as políticas públicas sejam discutidas pelos povos.

O eixo dois discutiu a “Autodeterminação, participação social e direito à consulta”. Na opinião do indígena Taravy Kayabi esse tema é muito importante, pois fala dos direitos que estão garantidos na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que vem acumulando experiências na implementação dos direitos reconhecidos a esses povos sobre as mais diversas matérias, tais com o direito de autonomia e controle de suas próprias instituições, formas de vida e desenvolvimento econômico, propriedade da terra e de recursos naturais, tratamento penal e assédio sexual. “Nós precisamos ser ouvidos pelo governo, e não o governo fazer coisas antes de consultar os povos indígenas”, declarou Taravy.

O palestrante Edmilton Cerqueira do Ministério do Desenvolvimento Agrário participou do terceiro eixo, que discutiu “Desenvolvimento sustentável de terras e povos indígenas”, e declarou que, assim como os povos indígenas os quilombolas e extrativistas também estão sendo ameaçados com a aprovação da PEC 215. “Se o desenvolvimento não é sustentável ele compromete a existência da natureza e das gerações futuras e é uma ameaça a humanidade”, afirmou.

O quarto eixo discutiu “Direitos Individuais e Coletivos dos Povos Indígenas”. Gersen Baniwa foi um dos palestrantes do quinto eixo que abordou o tema “Diversidade cultural e pluralidade étnica no Brasil”. Ele destacou que no continente americano não existe país tão diverso quanto o Brasil, sendo necessário a construção de políticas que levem isso em conta. “Está na hora de começarmos a desenhar, a pensar e construir políticas públicas para os povos indígenas que efetivamente levem em consideração essa diversidade cultural, diversidade linguística, territorial e regional” disse.

No sexto eixo o tema foi “Direito à memória e à verdade”, com a participação dos palestrantes Paulino Montejo da Apib, o indígena Suruí Aykewara, Luciana Nóbrega da Funai e Marcelo Zelic, do Grupo “Tortura Nunca Mais”. Na mesa os palestrantes falaram do período onde os povos indígenas ainda eram tutelados e sofreram várias agressões na ditadura militar, o que atingiu várias etnias. Um dos casos apresentados foi de decisões judiciais que obrigavam os indígenas a não permaneceram na cidade por mais de 24h, mostrando claramente o preconceito e a forma como os indígenas foram e são tratados até hoje, tendo impedido seu direito de ir e vir.

Depois da apresentação dos palestrantes as propostas construídas nas Etapas Locais e Regionais foram lidas e discutidas nos grupos.

 

Por Helena Indiara e Erisvan Bone